sexta-feira, 2 de abril de 2010

Alone Together.¹

Todos os dias, antes de dormir, ela rezava, pedindo para que tudo desse certo. Nada em especial, apenas... tudo. E antes de se deitar, ela virava o travesseiro, na esperança de que ao amanhecer encontrasse o seu próprio Maurice² lhe olhando. E ele nem precisava do cabelo ruivo, ou da bolsa mágica e da escada de soprar. Ele só precisava existir, ter um coração e gostar de flores, se possível. Só que ele nunca aparecia, o que já era de se esperar. Então, em todas as manhãs, ao olhar para todos os lados, ela soltava um longo suspiro, acompanhado de um "Está tudo bem".

Está tudo bem. Ela sempre dizia isso, mesmo não estando. E quase nunca estava. Não que ela passasse por grandes problemas, ou algo que o valha. Aliás, seu único e maior problema era ver seus sonhos serem despedaçados todos os dias. E não por alguém em especial. O que acontecia era que, ao abrir a porta, ela sentia que o mundo lá fora queria devorar tudo o que ela acreditava, sentia, esperava. E o mundo conseguia.

Quando falo "o mundo", não quero citar o Planeta Terra, como ser vivo. Não, não estamos em "A vingança de Gaia". O mundo, na verdade, trata-se do seu mundo. Aquelas pessoas, com quem cruza todos os dias, que conhecem o seu rosto, mesmo sem saber o seu nome. Que conhecem o movimento que os cabelos dela fazem, quando ela está apressada, mas que não sabem nada além disso. Apenas uma imagem superficial do que ela poderia ser. E essa ideia a encantava. Cada pessoa - cada merdinha de ser vivo dessa porra de universo - poderia ter uma interpretação diferente sobre ela, mesmo sem a conhecer. E ela também o fazia, a todo instante. Era uma mania quase que maníaca, de dar um nome, personalidade - de criar uma vida - para toda e qualquer criatura que cruzasse seu caminho. E isso, que era para ser uma distração, um passatempo, acabava deixando-a triste.

A vida de todo mundo era melhor que a dela.

¹Strokes.
²A Árvore dos Desejos, William Faulkner.

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